Os carnavais de antigamente
CRÔNICAS GUAJARAMIRENSES
Por: Paulo Cordeiro Saldanha
Davi Nasser e Jota Junior nos deixaram a letra e a música de Carnaval, cujos versos diziam: “Confete/ Pedacinho colorido de saudade/ Ai, ai, ai, ai/ Ao te ver na fantasia que usei/ Confete/ Pedacinho colorido de saudade/ Ai, ai, ai, ai/ Ao te ver na fantasia que usei/ Confete/ Confesso que chorei/ Chorei porque lembrei/ Do carnaval que passou/ Daquela Colombina que comigo brincou/ Ai, ai, confete/ Saudade do amor que se acabou”.
Chiquinha Gonzaga consagrou a marcha “Ó abre alas que eu quero passar/Ó abre alas que eu quero passar/Eu sou da lira não posso negar/Eu sou da lira não posso negar”.
A Marcha do Remador (se a canoa não virar, olê, olê, olê olá eu chego lá…), Chiquita Bacana, Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô, Índio quer apito, Nós os Carecas, Máscara Negra, Tem Nego Bebo Aí, Mamãe Eu Quero, Daqui Não Saio, Está Chegando a Hora, e dezenas de frevos que eletrizam multidões até hoje, são minhas recordações tão vivas. Eventual leitor se lembrará de outras músicas.
Tenho falado tanto em saudade que ela própria já está empanturrada de tantas reminiscências. Porém, falar dos carnavais do meu tempo dá aquela dignidade que eu preciso para acalentar as minhas lembranças.
Não vivi o carnaval da época do Colombina, clube situado ali na Avenida Presidente Dutra, próximo de onde hoje está fincada a Praça Barão do Rio Branco.
Todavia, recordo bem dos carnavais do Helênico, Guajará, Taba do Maracajá (hoje Boinas Rajadas), Cruzeiro, Rio Grande, Trabalhadores…
As marchinhas davam o ritmo que comandava os foliões. Os blocos visitavam ora um, ora outro clube, entusiasmando o público que se dividia, procurando saber quem eram os mascarados visitantes.
Porque não era proibida numa guerra de confete e serpentina, o lança perfume, grande combustível do período de Momo, ampliava a alegria e gerava a felicidade incontida que se encontrava nas letras e nas músicas das marchas entoadas, enquanto se pulava ou dançava na pista.
Nós éramos felizes… e sabíamos que brincar o carnaval nos transportava para uma espécie de Nirvana aqui mesmo na terrinha.
As fantasias ampliavam a formosura das moças e senhoras que desfilavam naqueles clubes, com o charme natural que ostentavam.
Nas ruas os blocos saíam, e até alguns deles “invadiam” de assalto as habitações amigas, atacando com talco e/ou farinha de trigo, sujando o chão e o chefe da família, quando exigiam bebida forte para deixar a residência e seus moradores em paz, até que outra casa identificada como de bom parceiro pudesse ser ocupada com o mesmo fim.
Aqueles nossos clubes se enfeitavam com rica e criativa decoração para receber os carnavalescos. Muitos não sabem, mas Guajará do passado tinha clubes dos quais nos orgulhávamos!
O Rossini, o Haroldo, o Bruno, Sebastião, Canhoto, Saninho, o Cabo Salvador, etc., não se cansavam e aconteciam até o amanhecer. Aqueles que tocavam instrumento de sopro ficavam com os lábios desfigurados, inchados mesmos, de tanto esforço. Mas o que importava era transportar alegria e felicidade aos grupos participantes daqueles folguedos (palavra antiga!).
Nos salões, ao repique de uma marcha mais ardente, mais ardorosa, a multidão se impulsionava das cadeiras em direção à pista, e os gritos emergiam traduzindo o êxtase pela celebração vivenciada ali naquelas horas.
Numa dessas, o Rafaelito Ocampo (grande caráter), a exemplo de outros, cheio de lança-perfume aspirada, entrou na pista de dança no mesmo instante em que a música parou visando o descanso do grupo musical. Os brincantes retornavam às suas mesas, ao passo que ele continuava pulando sozinho, absolutamente só, pensando ouvir a marcha que já tinha acabado, reinando parcial silêncio no ambiente.
E o Rafaelito, enquanto sob efeito do líquido gelado, ele sozinho, repito, pulava ao som de uma virtual marcha que só tocava no seu cérebro privilegiado. E os risos e as gargalhadas fluíam ante a imagem por ele distribuída, olhos semicerrados, braços ao alto. Até que o efeito do lança-perfume passou e o nosso herói, desconfiado e ruborizado, envergonhado mesmo, foi saindo de fininho…
Por ser considerada droga perniciosa, passível de causar mal à saúde, o lança-perfume no início dos anos sessenta ficou sendo proibido.
Mas tinha gente que ia fazer retiro espiritual, onde orações eram erguidas ao Senhor, pedindo “a redenção dos pecadores, em face dos excessos que na festa profana seriam praticados…”
Eu mesmo conheci alguns que iam para o retiro das 8 às 18 horas no Colégio Nossa Senhora do Calvário; mas à noite, depois das 22 horas, nos Clubes andaram “pecando” por pensamentos, ações, obras e intenções na festa considerada, naquele tempo, relativamente sacrílega.
Tempos bons! Que estão voltando graças aos blocos atuais que vão enriquecendo a cultura carnavalesca desta terrinha.
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