Os generais de Bolsonaro: quem são os militares de mais alta patente no círculo do presidente eleito
8 oficiais da mais alta patente das Forças Armadas, até o
momento, estarão no 1º e 2º escalão: são paraquedistas, estrategistas,
com experiência em missões de paz e chefia administrativa.
Tahiane Stochero, G1 SP
Ao assumir a presidência da República, em 1º de janeiro de 2019, o
capitão reformado do Exército Jair Bolsonaro (PSL) levará ao 1º e 2º
escalão do Executivo ao menos oito militares de quatro e três estrelas –
os dois níveis mais altos da hierarquia das Forças Armadas brasileiras.
O número de oficiais da mais alta patente dentre ministros é o maior
desde a redemocratização do país.
Até agora, o presidente eleito anunciou os nomes de sete generais do Exército e um almirante da Marinha (veja a lista abaixo).
O G1 fez uma radiografia deles. Em comum, todos são da reserva
remunerada e possuem mais de 60 anos, com experiência no comando de
unidades militares de grande porte, no Brasil e no exterior. Boa parte –
seis deles – são paraquedistas, assim como Bolsonaro, e já ocuparam
cargos na administração pública como civis (após passarem para a
reserva).
Dois deles, ainda na ativa, atuaram em posições como assessores
parlamentares da Força à qual pertenciam, possuindo trânsito e
capacidade de diálogo com os três Poderes (Executivo, Legislativo e
Judiciário). Um dos generais, inclusive, chegou a ser candidato a
governador nas eleições deste ano, não obtendo êxito. Poucos dos
escolhidos possuem atividade nas redes sociais e quase todos ocuparam
postos em missões de paz na ONU no exterior, em especial, no Haiti, onde
o Brasil comandou uma força multinacional das Nações Unidas por 13
anos.
Veja quem são os escolhidos:
Antônio Hamilton Martins Mourão (Vice-presidente)
Augusto Heleno Ribeiro Pereira (Gabinete de Segurança Institucional)
Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo)
Fernando Azevedo e Silva (Defesa)
Maynard Marques de Santa Rosa (Secretaria de Assuntos Estratégicos)
Floriano Peixoto Vieira Neto (secretário-executivo Secretaria-Geral da Presidência)
Guilherme Theophilo (Secretaria Nacional de Segurança Pública)
Almirante Bento Costa Lima Leite (Minas e Energia)
Os generais de Bolsonaro
Além do vice-presidente, eles comandarão cinco ministérios – incluindo a
Defesa, pasta criada em 1999 e que, até o governo de Michel Temer, era
chefiada por um civil. Estarão sob controle de militares postos
importantes de interlocução do governo com o Parlamento, com os estados e
os municípios, além da análise de contratos de propaganda governamental
e a decisão estratégica sobre projetos de longo prazo do país.
O número de oficiais da mais alta patente presente no 1º escalão do
Executivo em 2019 será o maior desde 1988, quando foi reescrita a
Constituição Brasileira, podendo ser ainda comparado ao formado pelo
último governante do regime militar.
João Figueiredo (1979-1985), que liderou o Planalto no período de
transição democrática, teve quatro generais ocupando ministérios
(Assuntos Fundiários, Casa Civil, Educação e Cultura e chefia do
Estado-Maior das Forças Armadas), conforme pesquisa realizada no Centro
de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas. O número de
generais no 1º escalão de Figueiredo chega a sete se forem incluídos os
três ministros das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) que,
na época, tinham status de ministério, o que não ocorre mais.
Figueiredo, assim como Bolsonaro, escolheu alguns civis com experiência
militar, mas de patente inferiores: um ex-estudante de escola militar
assumiu a pasta de Minas e Energia, o tenente-coronel Jarbas Passarinho a
Previdência Social, e outro coronel o Ministério do Interior.
‘Tropa de elite de paraquedistas’
Bolsonaro, que se formou como paraquedista militar em 1977, colocou no
alto escalão uma “tropa de elite” de paraquedistas – são seis generais
com a qualificação: além de Mourão, o futuro ministro do Gabinete de
Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno Pereira, o responsável
pela Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, o novo
ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e o futuro titular da
Secretaria Nacional de Segurança Pública, Guilherme Theophilo.
Acrescenta-se “à tropa de paraquedistas” o futuro comandante do Exército do presidente, o general Edson Leal Pujol.
No Supremo Tribunal Federal, um paraquedista também marcará presença: o
general Ajax Porto Pinheiro foi indicado para ser o assessor do
presidente da Corte, José Antonio Dias Toffoli. Assim como Pujol e mais
outros três generais do alto escalão de Bolsonaro, Pinheiro foi
comandante militar na missão de paz da ONU no Haiti, onde o Brasil
manteve tropas de 2004 a 2017. O número de oficiais da mais alta patente
escolhidos por Bolsonaro que esteve no Haiti chega a 6 se for
contabilizado o novo ministro da Defesa, que coordenou operações
multinacionais no país caribenho.
Mais três generais de Bolsonaro estiveram em operações internacionais de
paz no exterior: o vice, Mourão, atuou na Angola; o futuro ministro de
Minas e Energia, almirante Bento Costa Lima Leite, foi observador em
Saraievo e o general Theophilo atuou como observador na América Central.
Lima Leite diferencia-se ainda dos demais generais por ter perfil
técnico específico – era, até então, diretor-geral de Desenvolvimento
Nuclear e Tecnológico da Marinha.
Apenas dois dos oficiais – Mourão e Theophilo – são ativos nas redes
sociais. Um terceiro, o general Santa Rosa, que assumirá a Secretaria de
Assuntos Estratégicos (SAE), costuma se pronunciar através de artigos
em blogs e sites especializados. Os demais, são apontados como
“estrategistas”: costumam analisar o cenário e dialogar em busca de
resultados.
Outros militares
Além deles, dois civis com experiência militar comandarão ministérios: o
engenheiro formado pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) Tarcísio
Gomes de Freitas chefiará a Infraestrutura e o professor de colégios
militares Ricardo Vélez-Rodríguez ficará no comando da Educação.
O tenente-coronel da reserva da Aeronáutica Marcos Pontes, que foi piloto de caça e astronauta, chefiará a Ciência e Tecnologia.
Núcleo militar
A escolha de militares para a cúpula do Executivo, segundo o sociólogo e
professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Adriano Codato, que
estuda a formação política brasileira após a Constituição de 1988, é
resultado de dois fatores:
– o fato do PSL, partido de Bolsonaro, “ser pequeno e sem estrutura”
– a dimensão simbólica de uma “convocação às Forças Armadas”.
No segundo turno das eleições, o ainda candidato prometeu que, se
eleito, iria escolher todo o primeiro escalão a partir de critérios
técnicos, sem a interferência de partidos políticos, além de requisitos
como “competência, autoridade, patriotismo e iniciativa”.
“Os militares tendem a funcionar nesta conjuntura como substitutos
‘neutros’, ‘imparciais e, ‘técnicos’ aos políticos profissionais,
envolvidos constantemente em escândalos de corrupção. Reedita-se a
mitologia, enterrada desde o fim da ditadura, de que os militares
seriam, por excelência, ‘servidores públicos’ desinteressados”, diz
Codato.
Para o pesquisador, é impossível prever o impacto da atuação de tantos
oficiais no 1º escalão. “Os militares, tanto como corporação quanto como
indivíduos, estão afastados há muito tempo da elite administrativa do
Estado brasileiro. O maior risco pode ser não exatamente a interferência
dos militares no Executivo, mas a interferência no sentido inverso, do
Executivo e, portanto, da política partidária e dos interesses
econômicos, nas Forças Armadas. O quanto esse caminho inverso pode
influenciar as Forças Armadas, é impossível, hoje, prever”, afirma ele.
Codato cita que o presidente da República possui 23 mil cargos de livre
nomeação e que, neste caso, “é impossível” falar-se em uma
“militarização” da administração pública. “É preciso não confundir a
presença dos militares à frente de ministérios importantes com a
militarização da administração do Estado”.
O cientista político Alcindo Gonçalves, da Universidade Católica de
Santos, entende não ser possível comparar o “núcleo militar” do governo
Bolsonaro com a presença de oficiais no comando do país no regime
imposto em 1964.
“A nomeação de militares é diferente de um governo das Forças Armadas,
um poder exercido pelas Forças Armadas, quando você tinha generais,
almirantes e brigadeiros da ativa representando as Forças Armadas no
comando do Executivo”, diz.
Gonçalves diz ainda que, apesar de os militares escolhidos por Bolsonaro
serem da reserva, há “uma mudança importante na política brasileira”.
“Agora, temos um governo de alguém que foi militar, um civil que foi
eleito, e que escolhe figuras militares individualmente, por suas
qualidades, méritos e experiências, segundo o próprio Bolsonaro
explicou, mas que trazem consigo valores culturais que representam uma
postura militar”, diz o especialista.
“Não podemos achar que militar é uma ave rara. Eles possuem aprendizados
que podem contribuir para a função pública. O que não pode haver é
misturar ideias da tradição militar na interferência da condução
política”, salienta o professor.
G1/montedo.com