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Loteria Aérea Brasileira – “O destino de toda a Família Militar foi decidido numa salinha de Brasília por meia dúzia de generais caquéticos…”


REVISTA SOCIEDADE MILITAR

O destino de toda a Família Militar foi decidido numa salinha de Brasília por meia dúzia de generais caquéticos e enfastiados, como se todos nas Forças Armadas fossem generais.

Tendo em vista as comemorações dos oitenta anos da FAB (trinta dos quais eu ajudei a construir), nada tenho a comemorar. Pelo contrário, só tenho a lamentar. Mas como lamento é coisa de maricas – de acordo com o único responsável por toda a mazela que se abateu sobre o Veteranistão – resolvi enviar uma mensagem para o futuro. Esta mensagem tem dois alvos. O imediato são os veteranos, suboficiais e sargentos, que, como eu, estão carregando mais essa canga, chamada Lei 13.954/19. O segundo alvo são os jovens, que estão pensando em ser militares. A eles, mais do que aos primeiros, vai o meu aviso sincero: se quiserem ser militares, sejam oficiais ou procurem outra carreira. A eles a mensagem na garrafa…

Lá pelo final dos anos noventa, quando entrei na FAB, os militares se aposentavam com um posto acima aos trinta anos de serviço, havia anuênio e licença especial. Não era o melhor dos empregos, mas mesmo a carreira de sargento dava uma perspectiva de futuro confortável. Num Brasil, que desde sempre vivia na corda bamba, poucos saíam a busca de aventuras. Dez anos se passaram e a MP 2.215 passou a foice em tudo. Cortou todos os benefícios seculares que davam dignidade mínima aos militares, principalmente aos praças. Fazendo tábua rasa de três quartos da tropa, o destino de toda a Família Militar foi decidido numa salinha de Brasília por meia dúzia de generais caquéticos e enfastiados, como se todos nas Forças Armadas fossem generais, brigadeiros e almirantes.

Mas a carreira de sargento tem pouco ou nenhum incentivo para quem gosta de exercitar os miolos mais do que o corpo. Ao contrário do que ocorre com os oficiais, o aprimoramento profissional e principalmente intelectual do sargento é um artigo de fé. Quem não procura conhecimento por conta própria corre o risco de ter o cérebro necrosado quando vai para a reserva. Entre o curso na EEAr e o CAS (curso exigido para se chegar a suboficial), eram inacreditáveis e intermináveis vinte e um anos. Uma modorra mental digna de um lambedor de selos do século XIX…

A atual reestruturação “fake” foi empurrada no Congresso como maneira de inflar os salários dos generais, mas essa “inflação” não puxou a tropa, como seria de se esperar. Quando a onda chegou na baixa canalha, invocou-se o abracadabra do Paulo Guedes, a “meritocracia”, e os generais donos da verdade eterna decidiram que todos os suboficiais que foram para a reserva entre 2001 e 2019 eram deficientes mentais ou preguiçosos patológicos e “não quiseram realizar os cursos de aprimoramento”. Tais cursos, que só existiam na mente dos generais, significariam um aumento de salário de quase dois mil reais. Ou seja, fui punido retroativamente por inação, quando nem o objeto da inação existia!

Como se por trinta anos eu não tivesse sido avaliado por alguns oficiais incapazes de amarrar o próprio sapato sozinhos. Como se por trinta anos eu não tivesse, de fato – mas nunca de direito – tomado decisões e resolvido questões bem acima da competência regulamentar a mim atribuída para que o perfumado e perdido oficial (muitas vezes, temporário) apenas assinasse o papel e ganhasse tapinhas nas costas do comandante. Comandante que já passara por aquilo tudo, que já fora um tenente enrolado; comandante que sabia muito bem que é assim que a banda toca. O mesmo comandante, que, quando se tornou brigadeiro, como uma velha rainha desmiolada, esqueceu tudo! Esqueceu o sargento que incontáveis vezes livrou a sua cara, quando ambos eram “companheiros” de Seção. Esqueceu o suboficial, o cabo, o soldado… Está sendo esse, aliás, o bordão da nova ordem militar brasileira, “olhar para o futuro, esquecer o passado”. Quem conseguiu ganhar algo nessa loteria, que é a vida do sargento da FAB, parabéns!

Ao jovem, que numa praia deserta encontrar esta mensagem, se você pensa em seguir carreira militar, pense bem. Pense muito. Aqui não há regras, e, se houver, elas mudam no decorrer do jogo, sem aviso prévio. Não há justiça igualitária. Mas há, sim, privilégios de “casta”. Se você escolher errado, estará condenado para sempre a ser um pária. Terá uma vida incerta. O que vale hoje talvez não valha amanhã. Talvez não exista daqui a trinta (e cinco) anos.

O que vigora são as vontades tresloucadas, camufladas de “necessidades da Administração”. Mas nunca esqueça que na FAB a “Administração É o Brigadeiro”. Não seja sargento da FAB. Não compensa. Seja oficial ou seja civil. A você, jovem, vai o meu apelo. Acautele-se para não ser deixado para trás no futuro. Previna-se contra os traidores, que certamente, cedo ou tarde vão acossá-lo. Evite ser esfaqueado pelos seus próprios comandantes, como eu e tantos outros veteranos fomos.

Este é um País que não valoriza a sabedoria de seus velhos, e por conseguinte suas Forças Armadas são recheadas de generais gananciosos que sem pestanejar trocam facilmente a honra de seus soldados por trinta moedas de prata.

  JB Reis, SO RR fab – Revista Sociedade Militar


Edmilson Braga - DRT 1164

Edmilson Braga Barroso, Militar do EB R/1, formado em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Rondônia e Pós-graduado em Gestão Pública pela Universidade Aberta do Brasil.

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